O papel da visão na inclusão social do idoso

O papel da visão na inclusão social do idoso nunca foi tão evidente quanto no mundo atual. Sabemos que, no Brasil, a velocidade do envelhecimento populacional tem aumentado o número de brasileiros com catarata, glaucoma e degeneração macular relacionado à idade, principais condições que respondem pela deficiência e perda da visão a partir dos 60 anos.

O envelhecimento da população, somado a estas condições oftalmológicas e à dificuldade de assimilar as novas tecnologias em atividades corriqueiras do dia a dia, como por exemplo, realizar transações bancárias, utilizar eletrônicos para se informar ou manter a conexão com o mundo, formam verdadeiras barreiras para a inclusão ao mundo digitalizado de grande parte da população mais velha.

Não por acaso, Simone Beauvoir avalia em sua obra “A Velhice” (1970), que o envelhecimento vai além do avanço da idade. Na análise de Beauvoir, envelhecer inclui o processo de “exílio” imposto via exclusão do mercado de trabalho, perda da integração com familiares ou amigos, e pela falta de políticas públicas de inclusão social que preparem os idosos para atividades compatíveis à sua maior integração.

Neste sentido, o tratamento da catarata, uma opacificação do cristalino que resulta em visão embaçada e leva à cegueira se não for tratada, é uma das atividades mais frequentes e gratificantes da Oftalmologia. Isso porque, todos nós um dia vamos ter catarata e o único tratamento é a cirurgia em que retiramos o cristalino opaco e implantamos uma lente intraocular no mesmo local do globo ocular. O procedimento é bastante seguro, rápido, indolor e, no dia seguinte, a maioria dos pacientes já fazem planos para retomar hobbies ou voltam ao trabalho com mais autoestima.

Vale ressaltar que, se por um lado as novas tecnologias podem significar mais uma forma de exclusão de parte dos idosos, por outro lado funcionam como ferramentas que estão revolucionando a precisão dos diagnósticos e das terapias para todas as doenças oculares. Além disso, hoje estão presentes em aplicativos que facilitam a adesão ao tratamento, um tipo de ferramenta importante para quem tem glaucoma. A condição danifica o nervo óptico e, frequentemente, está associada ao aumento da pressão intraocular. O tratamento pode incluir instilação de colírios, medicamentos, terapia a laser e cirurgias, dependendo da gravidade da condição.

Um aplicativo que pode ser utilizado para incentivar a adesão ao tratamento do glaucoma é o Elfie , disponível para download gratuito. Além de monitorar o uso dos medicamentos para evitar falhas no uso que podem comprometer todo o tratamento, o aplicativo estimula atividades saudáveis, oferecendo ao usuário “moedas” para cada atividade concluída. As moedas podem ser trocadas por prêmios, doações ou descontos de algumas marcas e visam estimular a manutenção de um estilo de vida mais saudável.

A evolução tecnológica trouxe melhorias significativas nos auxílios ópticos, como óculos com lentes progressivas, dispositivos eletrônicos que ampliam textos e imagens, além de softwares de leitura essenciais para garantir a independência de quem sofre DMRI (Degeneração Macular Relacionada à Idade). A condição, que afeta a parte central da retina, levando à perda progressiva da visão central, pode ser do tipo seca ou úmida. O tratamento varia de acordo com o tipo e pode incluir suplementos nutricionais até terapia com injeções intravítreas para a forma úmida.

As reflexões de Beauvoir nos convida a repensar sobre a condição humana no envelhecimento. Ela nos desafia a repensar a forma como a sociedade lida com a velhice e a trabalhar para garantir que os idosos tenham acesso a cuidados de saúde adequados.
Nos convida, ainda, a construir uma sociedade onde a visão seja acessível a todos, independentemente da idade. Ao integrar avanços na oftalmogeriatria com um compromisso social para a inclusão, podemos garantir que os idosos não apenas vivam mais, mas vivam melhor, com dignidade e respeito.

Leôncio Queiroz Neto é diretor executivo do Instituto Penido Burnier, membro do CBO (Conselho Brasileiro de Oftalmologia) e da ABCCR (Associação Brasileira de Catarata e Cirurgia Refrativa).